Laura Elisabete Figueiredo Brito[1]
Resumo:
As redes sociais digitais têm ganho importância na vida social e política das pessoas. É nesses espaços que criamos redes, trocamos e procuramos informações, e construímos laços com pessoas de todos os lugares do mundo. Os movimentos sociais agarraram a oportunidade e tornaram-se eles também digitais. No caso dos movimentos sociais feministas, a partilha de testemunhos e experiências entre mulheres permitiu o reconhecimento e a visibilização de algumas lutas, como é o caso das lutas contra a violência obstétrica. A internet foi uma peça fundamental para os movimentos sociais feministas da América Latina sensibilizarem e fazerem pressão juntos dos sistemas de saúde para se estabelecerem condições para um parto humanizado. Esta luta ganhou uma proporção mundial graças às partilhas dos testemunhos, demonstrando que esta era uma realidade partilhada por muitas mulheres.
Palavras-chave: movimentos sociais: redes sociais digitais; ciberativismo; violência obstétrica; justiça reprodutiva
Introdução[2]:
Inicio a minha reflexão com base nas seguintes premissas: as mulheres são, na grande maioria das sociedades, as principais cuidadoras (Santos, 1991) e educadoras para a saúde (Martins, 2004); são também elas que, no que diz respeito à utilização das redes sociais digitais, são as maiores utilizadoras do ciberespaço (Sena e Tesser, 2017; Joaquim, 2006) e são as que mais reconhecem a importância da internet enquanto ferramenta de comunicação entre indivíduos. Assim, este artigo pretende demonstrar de que forma as redes sociais digitais e o ciberespaço permitiram que os movimentos sociais dessem visibilidade às vítimas e ao problema da violência obstétrica pelo mundo todo. Para tal, irei trabalhar com os conceitos de violência obstétrica, vítima, redes sociais digitais e ciberativismo.
Gostaria de relembrar os leitores de que, embora possa parecer um cenário idílico, quando se começou a tratar da questão da violências obstétrica nas redes sociais, também se criaram tensões entre as/os envolvidas/os. Isto é, a vontade de mudança levou a que, em alguns espaços do mundo virtual, um discurso que se queria informativo e que apresentasse diferentes possibilidades às mulheres grávidas e mães, se tornasse crítico e sentenciador daquelas que preferiam manter um percurso tido como mais convencional. Focar-me-ei, neste artigo, no caso específico das violências obstétricas que têm, nos últimos 20 anos, ganho espaço no debate feminista, e também biomédico, através da informação exposta pelas redes sociais e pela internet no geral, não atentando às pressões exercidas entre pares, ainda que este seja um tema a desenvolver no futuro.
Os debates em torno do feminismo têm sido permeados por críticas sobre a caracterização das mulheres enquanto ‘sujeito uno’ e coletivo. No entanto, as mobilizações feministas das últimas duas décadas – através de fóruns sociais e redes internacionais – demonstram que as mulheres são um grupo que, sim, tem experiências semelhantes e isso não é um argumento para um discurso normativo ou essencialista. O poder essencial do movimento feminista centra-se na noção das mulheres como coletivo, pois permite conceptualizar a opressão como um processo que é sistemático, estrutural e institucional e que atravessa todas as sociedades (Young, 2003).
O movimento feminista tem, desde a sua génese, uma dimensão internacional. Manuela Tavares e colegas, referem como exemplo a Conferência Internacional das Mulheres em Copenhaga (1910); o I Congresso Feminista Internacional na Argentina (1920) e o Congresso de Feministas Internacionais em Genebra (1920), organizado pela Aliança Internacional para o Sufrágio das Mulheres (Tavares et al.¸ 2004, p.5). Desde então, vários foram os momentos em que, a nível mundial, se pode observar a mobilização das mulheres enquanto coletivo pela luta contra o sistema patriarcal hegemónico.
O presente artigo encontra-se dividido em duas partes. Num primeiro momento, irei abordar a relação entre o movimento feminista e a ideia de vítima e como é que estes dois se articulam com a violência obstétrica de forma a possibilitar uma mobilização que questione o status quo da hegemonia biomédica. Na segunda parte, irei demonstrar como as redes sociais digitais potenciaram o debate sobre violência obstétrica e permitiram que, não só alcançasse várias geografias, mas também o reconhecimento social da presença de vítimas de violência, dentro de um sistema difícil de criticar, como é o caso da biomedicina e do cuidado à grávida e parturiente.
Feminismo, vítimas, violência – o conceito de violência obstétrica
Desde a década de 70 que o movimento feminista tem lutado pelos direitos sexuais e reprodutivos das mulheres. Esta luta passou por vários temas, desde o acesso à contraceção hormonal até à legalização da interrupção voluntária da gravidez. A base desta luta parte sobretudo da crítica das militantes à biomedicina. Estas denunciavam o sistema médico ocidental por ser uma instituição patriarcal que se autoriza a controlar o corpo e a vida das mulheres, à semelhança da igreja e do estado. O seu objetivo principal era, e continua a ser, desconstruir o discurso biomédico que apoiaria a subordinação social das mulheres, historicamente consideradas como a versão biologicamente inferior do homem (Vuille, 2016). Esta desconstrução começou fortemente nos espaços que viam nascer novos estados democráticos e onde, cuidados holísticos de assistência no parto eram mais comuns, como era o caso da América Latina.
Durante o século XX nasceu, um pouco por toda a América Latina, um forte debate sobre as violências ginecológicas e obstétricas e como combatê-las. O tema tornou-se pauta das lutas dos movimentos sociais feministas e das investigações em ciências sociais e da saúde em diversos contextos (Sena e Tesser, 2017, p.209). O Brasil foi pioneiro nestas discussões com a criação, em 1993, da fundação Rede pela Humanização do Parto e do Nascimento (ReHuNa)[3] e com a primeira Conferência Internacional pela Humanização do Parto, realizada em 2000. Nesta conferência reuniram-se várias ativistas da América Latina, investigadores e profissionais de saúde, todas/os em busca de respostas para os números elevados de intervenções durante o parto e o reconhecimento da existência de abusos sobre as parturientes (Sadler et al., 2016, p.50). É nesta conferência que é criada a Red Latinoamericana y del Caribe para la Humanización del Parto y el Nacimiento (RELACAHUPAN)[4] que passou a liderar o debate na região.
A luta contra a violência obstétrica nasceu e cresceu transnacional, tendo sido promovida em grupos da sociedade civil em vários países. Desde 2014, foram criados cinco Observatórios da Violência Obstétrica, com base nos movimentos sociais, no Chile, Espanha, Argentina, Colombia e França (Sadler et al., 2016). Em março 2016, lançaram um comunicado conjunto declarando: “(…) a violência obstétrica tem sido uma das formas mais invisíveis e naturalizadas de violência contra as mulheres e constitui uma séria violação dos direitos humanos” (Sadler et al., 2016, p.50). Durante todas as campanhas de consciencialização, os movimentos feministas em prol da humanização do parto procuraram dar visibilidade à violência obstétrica como resultado de uma medicalização da vida da mulher e do seu ciclo reprodutivo.
O processo da gravidez e do parto têm sido, já há muitas décadas, e em praticamente todas as sociedades, sujeitos a uma regulação através de diversos mecanismos de poder e do sistema biomédico. Um sistema que procurava definir quais os procedimentos que deviam ser incentivados e aqueles a serem evitados (Belli, 2013). Este foi um caminho liderado pela biomedicina pelo que, o foco principal do debate é nas violências obstétricas que ocorrem em contexto hospitalar e que são veiculados pela biomedicina. Esta distinção é importante pois, o sistema biomédico é atravessado pelas construções patriarcais, a relação assimétrica entre mulheres e os profissionais de saúde revelando uma desigualdade que é antes de mais simbólica, mas com efeito no real e que dificulta o exercício dos direitos básicos da mulher (Belli, 2013). A violência é, muitas vezes, um conceito abstrato, mas tem consequências muito concretas que precisam ser assinaladas. Acontece que, por vezes, a menos que a violência seja de ordem física, torna-se difícil de ser reconhecida.
É difícil encontrar uma definição oficial do termo ‘violência obstétrica’, pois existe ainda alguma dificuldade em reconhecer que estas existem. No entanto, por muitas variações que possam existir, uma das definições base é aquela que se pode encontrar na lei Venezuelana, aprovada em março 2007, com o nome Ley Orgánica sobre el derecho de las mujeres a una vida libre de violência[5]. Esta lei é inovadora no sentido em que é o primeiro documento legal que contém um enquadramento sobre a violência obstétrica enquanto violência de género. No Artigo 15, alínea 13, pode-se ler que:
[…] entende-se por violência obstétrica a apropriação do corpo e processos reprodutivos das mulheres pelos profissionais de saúde, que se expressa num tratamento desumanizador, num abuso de medicalização e patologização dos processos naturais, trazendo consigo perda de autonomia e capacidade de decidir livremente sobre os seus corpos e sexualidade, impactando negativamente a qualidade de vida das mulheres (Venezuela, Lei Nº 38.668, Artigo 15, alínea 13).
Acrescentarei a esta definição, os cincos tipos de violência obstétrica definidos pela Organização Mundial de Saúde (OMS) (Castrillo, 2016): 1. Intervenções e medicalização desnecessária e rotineira; 2. Maus-tratos, humilhações e agressão verbal ou física; 3. Falta de mão-de-obra, instalações inadequadas; 4. Exercício de residentes e profissionais sem autorização da mãe com informação completa, verdadeira e suficiente; y 5. Discriminação por razões culturais, económicas, religiosas e étnicas. Pode-se, assim, considerar as violências obstétricas como todas as situações de engano, humilhação, manipulação da informação, negação de tratamento e outros danos maiores feitos à saúde da mulher (Villanueva, 2010). É de notar que, o que está em causa, não é a validade dos procedimentos ou a qualidade da atenção biomédica. A violência obstétrica é uma violação dos direitos sexuais e reprodutivos das mulheres e não necessariamente uma questão de negligência médica.
O conceito de violência é um conceito construído social e historicamente e que se altera em função das posições de poder dos envolvidos. Assim, Belén Castrillo (2016) defende que a “invenção” da definição da violência obstétrica está assente nas alterações potenciadas pelos movimentos sociais sobre o regime de legitimidade relativa às violências a que as mulheres são sujeitas. Quem é vítima de violência obstétrica é bastante consensual – as mulheres-mães e os recém-nascidos (Castrillo, 2016). O problema no reconhecimento da violência em todos os processos que envolvem a gravidez é quase de ordem técnica. A grande maioria das práticas entendidas, atualmente, como violentas são, à vista de medicina, rotineiras e baseadas em evidências científicas que assentam no saber-poder-fazer do profissional de saúde (Castrillo, 2016).
Aquilo que para uma mulher pode ter sido uma situação de violência, para os profissionais de saúde pode ser uma resposta habitual a uma emergência obstétrica. As interpretações serão sempre heterogéneas e relacionadas com os valores morais valorizados no contexto sociocultural a que pertencem os envolvidos (Castrillo, 2016). Assim, é uma questão realmente de sensibilização de demonstrar à população feminina que a sua experiência de sofrimento é legítima e que nem todas as práticas – físicas ou verbais – são aceitáveis somente por serem praticadas por profissionais de saúde ou em contexto hospitalar.
A alteração das fronteiras morais e sociais da sociedade contemporânea serviu de estímulo para que se questionasse cada vez mais de que forma os partos eram praticados e a sua extrema medicalização (Castrillo, 2016). Este é um questionamento que, ao contrário daquilo que se poderá pensar, não exige que os partos deixem de se fazer em contexto hospital, ou que sejam auxiliados por profissionais de saúde. Exigem, em vez disso, que a legitimidade do processo do parto, volte a recair sobre a principal atriz do momento – a mulher. Pede-se, também, que os cuidados durante o parto sejam baseados no respeito e na vontade da parturiente e que se impugnem práticas que já foram reconhecidas como violentas (Castrillo, 2016).
É necessário também reconhecer que as situações de violência são também relações sociais (Izaguirre, 1998:8), profundamente vinculadas a um poder hierárquico desigual e que, ao serem legitimado, permitem às vítimas falar sobre os acontecimentos, mas também exigirem justiça (Castrillo, 2016). Definir e reconhecer a violência obstétrica, chama à atenção para as raízes do ensino médico contemporâneo e das estruturas de poder que atravessam a biomedicina (Sadler et al., 2016, p.50). Assim, a violência obstétrica, por se enquadrar na violência de género e ser baseada num desequilíbrio das relações de poder, tem de ser analisada à parte das restantes violências médicas. Se não, poder-se-á cair na tentação de enquadrá-las como negligência, o que nem sempre é o caso e afasta o debate da verdadeira raiz do problema, que é a sobre medicalização da vida humana, e especialmente da vida das mulheres.
A biomedicina é um sistema sociocultural, com uma história complexa e um conjunto bastante consistente de crenças, regras e práticas (Gaines & Hahn, 1985) que respondem e reproduzem as construções de género. Segundo Stephanie Montesanti e Wilfreda Thurston (2015) esta é uma forma de violência estrutural, uma manifestação invisível de violência que está entrelaçada no tecido social, produzindo e reproduzindo desigualdades sociais entre grupos. Contudo, é importante não focar o debate da violência obstétrica sobre as más práticas individuais de alguns profissionais, por estes ainda olharem com desconfiança este debate (Sadler et al., 2016). É por isso que, os primeiros avanços neste debate centravam-se em termos como ‘parto humanizado’ e ‘promoção dos direitos humanos das mulheres’ (Sadler et al., 2016, p.51). Uma forma de contornar, através do discurso, as potenciais tensões entre ativistas e profissionais de saúde e ir, assim, conquistando aos poucos aliados por parte da comunidade científica.
As ciências sociais têm sido umas das aliadas das ativistas, ao abordarem a violência obstétrica como um assunto de violência estrutural e de género, em que existem relações assimétricas de género e um processo de objetificação das mulheres (Sadler et al., 2016). Esta objetificação faz-se através da construção do pensamento biomédico com base no corpo masculino como representação da norma e o corpo feminino, e suas particularidades, como incorporação de anormalidades, doenças e desvios:
O discurso profissional e legal sobre o diagnósticoda gravidez, dos sintomas da gravidez e da mulher grávida retornar ao estado normal depois do parto são algumas das marcas subtis das várias marcas de uma normalização masculina (Sadler et al., 2016, p.51)
Esta abordagem relembra Foucault (1978; 1989), que descrevia a emergência do controlo do parto através das instituições como a igreja, o estado e mais tarde a medicina. Podemos entender a violência obstétrica como parte do bio-poder da medicina, em que os corpos das mulheres grávidas e das parturientes é o oposto da feminilidade. Os atos de violência seriam a forma de controlar e dominar um corpo que saiu da norma (Sadler et al.¸2016, p.51) pelo que os atos físicos, verbais e simbólicos de violência seriam aceites com base nesta ideia. Os contextos hospitalares têm sido definidos nas ciências sociais como uma grande cadeia de forças patriarcais em que a dominação masculina e a submissão feminina acontecem através da força, mas também através de mecanismos discretos e naturalizados dentro da prática biomédica (Sadler et al., 2016). É precisamente os procedimentos tidos como normativos, mas que colocam as mulheres em situação de fragilidade emocional e física que os movimentos sociais procuram denunciar na luta contra a violência obstétrica.
Quando a categoria ‘violência’ é mobilizada no discurso dos movimentos sociais, exige-se, portanto, um reconhecimento sobre o que é violência, quem é a vítima e quem a perpetra. O conceito de vítima é, também, uma palavra-chave para a mobilização dos movimentos sociais sobre esta temática. É essencial, pois, a vítima pressiona o status quo para uma nova relação entre o Estado e as pessoas (Mendes & Araújo, 2016) e, ao organizarem-se em comunidades e movimentos sociais, as vítimas e suas apoiantes movimentam ações que questionam os pressupostos da cidadania. No caso das vítimas de violência obstétrica, as discussões em torno do problema levaram a um fenómeno claro de criação de comunidade (Erikson, 1994, p.231 apud Mendes & Araújo, 2016).
A experiência do parto é – desde que se iniciou o processo de medicalização – individual, singular ou restrito ao círculo afetivo mais próximo da parturiente. Se traumático, marca a mulher de uma forma que a pode levar a fechar-se sobre si própria, a acreditar que de alguma forma a culpa de uma má experiência é somente sua. Ao se criarem redes de partilha, como irei demonstrar na secção seguinte deste ensaio, cria-se um sentimento de pertença e de identidade (Mendes & Araújo, 2016). A experiência de violência, que colocou aquelas mulheres à margem do espaço simbólico da maternidade, quando dividida, aproxima-as novamente e torna o movimento e a luta mais fortes e coerentes.
Ao se articularem com o processo de produção simbólica de vítima, os movimentos sociais feministas têm tido um grande impacto no Direito e na Saúde. Isto permitiu, entre outras coisas, que alguns grupos sociais fossem reconhecidos como vulneráveis à violência, e consequentemente, como potenciais vítimas e detentores do direito a uma assistência específica (Sarti, 2011). Uma das críticas feitas sobre o estatuto de vítima, quando aplicado à violência obstétrica, relaciona-se com a passividade em que a mulher poderia ser colocada. No entanto, se olharmos o conceito numa perspetiva de género, as vítimas deixam de ser passivas de dominação masculina, mas antes atrizes de relações ambíguas e intersubjetivas (Sarti, 2011). Identificar estas mulheres como vítimas faz parte do anseio dos movimentos sociais por democracia e justiça, dentro de uma sociedade que peca na consolidação dos direitos civis, sociais e políticos (Sarti, 2011). Ser vítima é uma forma de exigir mudança, e não necessariamente um lugar de impotência.
O reconhecimento da categoria de vítimas permite a legitimação do trauma experienciado por mulheres vítimas de violência (doméstica, sexual, obstétrica, etc.). Quando uma mulher se enuncia como vítima de uma violência que contém uma componente forte de género, reivindica a sua posição e exige o reconhecimento social do que lhe aconteceu e a responsabilidade coletiva (Pulhez, 2013). Acionar os conceitos de violência/vítima exige que “(…) o reconhecimento social (não apenas legal) de que certos atos constituem abuso, o que exige decifrar dinâmicas conflitivas que supõem processos interativos atravessados por posições de poder desiguais entre os envolvidos” (Debert & Gregori, 2007, p.176).
Reivindicar o estatuto de vítima é também exigir uma reparação pelos danos, uma transformação moral da humanidade. É, nas palavras de Pulhez (2013, p.9), um momento de enunciação, discursivo, em que “(…) falam sobre uma violência que percebem como infligida sobre si mesmas, e desta forma abraçam a ideia de que é preciso falar para curar”. Na era das redes sociais digitais, em que nos encontramos atualmente, o falar sobre as experiências de violência obstétrica, toma uma nova dimensão. Os testemunhos de milhares de mulheres saem da esfera privada e saltam para a frente do palco, através do Facebook, do Twitter, blogs e outros meios.
O ciberativismo e o lugar da violência obstétrica nas redes sociais digitais
O advento da Internet, e a sua utilização massificada, intensificou como nunca visto o processo de globalização e alterou as relações sociais criando redes cada vez mais amplas e complexas (Brennand, 2018). As redes sociais digitais permitiram a criação de um novo espaço público, onde os medias e as comunidades virtuais deram azo à liberdade de expressão de uma forma que nunca tinha sido experienciada (Levy, 2002 apud Brennand, 2018, p.61). As sociedades em rede, criadas no espaço digital, produziram novas prática de cooperação e aprendizagem, possibilitando trocas culturais e simbólicas que antes da internet eram inimagináveis (Brennand, 2018).
Claro está que, a sociedade cria, há milhares de anos, redes de comunicação, mas estas foram claramente potenciadas pela internet. A era digital transformou a expressão da informação e permitiu a emergência de redes de saber que não existiam anos antes (Brennand, 2018). As fronteiras e distâncias geográficas deixaram de existir, os indivíduos redefiniram as categorias de pertença, passaram a poder interagir sem estar no mesmo espaço físico através das redes sociais digitais.
As redes sociais digitais podem ser definidas, utilizando os termos de Danah Boyd e Nicole Ellison (2008), como serviços digitais que permitem aos indivíduos construir perfis (públicos ou semipúblicos) dentro de um sistema delimitado pelos criadores e articular com uma lista de usuários do mesmo sistema. Há medida que o seu acesso se foi democratizando, as redes sociais digitais tornaram os fluxos de informação mais complexos e internacionais, facilitando o engajamento com os movimentos sociais que, por seu lado, cada vez mais procuravam meios de comunicação alternativos para se mobilizarem, organizarem e discutirem alternativas e permitindo o reconhecimento global das suas ações (Luz & Gico, 2016).
O ciberespaço permitiu sobretudo aos movimentos sociais mais interação entre grupos com as mesmas reivindicações e pautas, reconfigurando as bases da democracia e o palco das discussões (Brennand, 2018). A internet tornou-se o meio de comunicação em que indivíduos e coletivos conseguem ter a sua própria voz e atingir uma audiência internacional de milhões, ampliando a esfera pública à magnitude planetária (Ford & Gil, 2001, p.202). Através de fóruns, blogs, o Facebook, o Twitter, Instagram, YouTube – só para citar as redes mais utilizadas – assim como bases de dados, mailling lists, chats, todos temos acesso a testemunhos, textos jornalísticos não censurados, relatórios das organizações e movimentos sociais que lutam pelos Direitos Humanos, discussões multilinguísticas através de fóruns e grupos de apoios, vídeos e um sem fim de conteúdo postado diariamente (Ford & Gil, 2001). Criou-se, assim, lugar para uma nova forma de ativismo social, o ciberativismo.
O ciberativismo centra-se no ativismo online, através da internet. Enquanto organização e ação política baseia-se na difusão de informação nas redes (Di Felice, 2013, p.53), potenciando as características dos movimentos sociais tradicionais. Como Manuel Castells (2013) explica, os movimentos sociais, para exercerem o contrapoder têm de se construir com base num processo de comunicação autónoma, livre do controlo do poder institucionalizado. As redes sociais digitais oferecem essa possibilidade, ainda que na atualidade as fake news dominem uma grande parte do espaço digital. No entanto, as redes sociais digitais continuam a ser um espaço que permite deliberar e coordenar ações de forma desimpedida (Castells, 2013). O ciberativismo permite “a utilização da internet por movimentos politicamente motivados” a baixo custo e com maior visibilidade do que qualquer outro media de informação (Vegh, 2003, p.71 apud Bezerra, 2018, p.34).
Outra característica extremamente importante dos movimentos sociais que atuam através das redes sociais digitais, é a sua capacidade de criar comunidade. Por um dos atributos já referidos, o de “quebrar fronteiras”, as redes sociais digitais criam comunidades transnacionais, superando o medo, o individualismo e aliando pessoas com a mesma experiência. Para Castells (2013), as redes sociais digitais têm o potencial de serem redes horizontais, multidirecionais e interativas e que produzem redes dentro das redes, dentro dos próprios movimentos que passam para o espaço offline. Estas “redes de redes” (Castells, 2013, p.128) não têm um centro identificável, não precisam de uma liderança formal, nem de uma organização vertical. É uma estrutura descentralizada que maximiza a participação, com fronteiras fluidas que vai se reconfigurando com o envolvimento da população.
Uma das formas de envolver a população nas redes sociais digitais é através da partilha de experiências, de testemunhos, de dar uma cara e voz à luta. No caso dos movimentos sociais feministas e a sua luta contra a violência obstétrica, a partilha dos testemunhos foram essenciais e ancoraram-se em outras duas características essenciais dos movimentos sociais (online e offline) – terem a capacidade de serem locais e globais. A luta contra a violência obstétrica começou na América Latina, mas depressa se catapultada para outros contextos geográficos (Castells, 2013).
A última vantagem dos movimentos sociais digitais, é a ‘viralidade’ das campanhas online. Por exemplo, em França, no ano de 2014, os movimentos sociais contra as violências obstétricas acionaram campanhas de recolha de testemunhos. Uma estudante de enfermagem lançou o, #PayeTonUtérus, recolhendo, em apenas 24h, cerca de 7000 testemunhos. O impacto destes testemunhos levou a que a Secretária de Estado para a Igualdade entre Homens e Mulheres, Marlène Schiappa, pedisse ao Alto Comissariado para a Igualdade um relatório sobre o assunto (Franeczek, 2018; Bousquet et al., 2018). A capacidade viral da internet transporta os utilizadores para contextos e culturas diferentes, em que podem ver e ouvir protestos e inspirar-se para a mobilização, formando cadeias de esperança na mudança (Castells, 2013) e terem contacto com realidades que desconheciam anteriormente.
No entanto, é claro que as redes digitais e as ações online não bastam para a ação coletiva. Têm a capacidade de mobilizar, organizar, deliberar, coordenar, mantém a comunicação entre as pessoas que aderem ao movimento e a sociedade em geral, mas precisam de uma estrutura mais coesa para realmente atingir uma mudança social que supere a dominação institucionalizada. Pelo que, no caso da violência obstétrica, a ação dos movimentos sociais digitais é extremamente importante na medida em que mobiliza, que une as mulheres na partilha das experiências e visibiliza um problema que é da esfera privada, mas que é um problema de saúde pública. No entanto, necessitará de outro tipo de ação para poder provocar mudanças.
De qualquer forma, é importante relembrar que a chave do sucesso dos movimentos sociais online, e sobretudo da luta contra a violência obstétrica, estabelece-se principalmente através da autoapresentação, da comunicação de pessoas reais sobre e para pessoas reais (Castells, 2013). Se, o mais importante legado de um movimento social é a mudança que produz com a sua ação, se este nos permitir pensar de forma diferente sobre as dimensões fundamentais das nossas vidas e da vida dos outros, as instituições acabarão também elas por acompanhar a mudança. Castells relembra que “(…) qual seria o possível legado dos movimentos sociais em rede ainda em processo? A democracia. Uma nova forma de democracia. Uma antiga aspiração da humanidade, jamais concretizada” (Castells, 2013, p.141). Pode-se referir como exemplo desse legado as investigações que têm sido feitas sobre violência obstétrica, tanto pelas ciências sociais como pelas ciências biomédicas, as novas legislações aprovadas e a sensibilização dos profissionais de saúde para rever algumas características que lhe são estruturais e que reproduzem desigualdades de género.
O movimento feminista, à semelhança de outros movimentos, encontrou nas redes sociais e blogs uma nova geração de mulheres que expõe as suas ideias e ideais. Criaram espaços em que abordam diretamente e de forma reflexiva as violências a que são sujeitas. Nas redes sociais digitais, as mulheres tornam-se: “(…) atrizes sociais e as suas ações, ainda que heterogéneas, ainda que nem sempre qualificáveis como ação política, são parte integrante da formação política. Quer através das vozes, quer através dos silêncios, participamos na formação política de forma diversificada e, portanto, com resultados políticos diversos” (Canotilho & Magalhães, 2006, p.94). Nesta partilha de conhecimentos gera-se, no fundo, uma ecologia de saberes (Santos, 2006) e uma revalorização da experiência preciosíssima das mulheres de todo o mundo sobre o parto.
O feminismo nas redes sociais digitais veio proporcionar uma sociologia das ausências no que diz respeito à violência obstétrica (Santos, 2002). Mostraram os silenciamentos construídos pela abordagem hegemónica centrada no saber biomédico, na tecnologia e no parto como evento patológico (Luz, 2014). Silenciamentos que criaram um grande desperdício de experiência (Santos, 2002) relativamente ao parto e à sua assistência. As redes sociais online vieram mostrar às mulheres como a experiência do parto é mais ampla, e que existem diversas práticas que são mais humanas e holísticas (Luz, 2014) que têm sido renegadas por serem consideradas inferiores. Este é um silenciamento que permitiu ao discurso biomédico – uma forma de bio-poder (Foucault, 1978).
Pela sua independência política e económica, as redes sociais digitais seguem um caminho mais democrático (Downing, 2002) que os medias tradicionais, apresentando várias hipóteses aos utilizadores. Segundo Pierre Lévy (1997, 2002 apud Luz, 2014), e retomando o pensamento de Foucault sobre bio-poder (Foucault, 1978), a transparência da internet promove formas de biopolítica e práticas democrática de resistência ao poder. No espaço virtual recria-se o vínculo social através de uma ecologia de saberes (Santos, 2006), do reconhecimento, escuta e valorização de singularidades. É dentro deste paradigma que Lia Luz (2014) inclui na sua investigação, os blogs mantidos por ativistas da humanização do parto como espaços de mediação discursiva que permitem o exercício da cidadania e a reinvenção da emancipação social (Luz, 2014; Santos, Menezes e Nunes, 2004) por serem espaços alternativos de cidadania.
Os canais alternativos de comunicação que constituem as redes sociais digitais, servem de resistência ao pensamento neoliberal e têm sido utilizados como ferramentas organizativas contra o poder estabelecido e a produção de invisibilidades relativamente às experiências traumáticas de parto (Luz, 2014, p.128). As mulheres, um pouco por todo mundo, têm-se organizado para exigir um parto humanizado, produzindo uma esfera pública única, mais visível e com mais probabilidade de desafiar o discurso dominante (Luz, 2014: 128). Como pudemos ver, por exemplo, com o caso do Rehuna no Brasil, as discussões a respeito da violência obstétrica passaram de dentro da rede para junto de outras mulheres e mães, usuárias do sistema de saúde. A problematização da violência institucional no parto foi impulsionada, primeiro através de mailing lists, tais como “Amigas do Parto” e “Parto Nosso” (Sena & Tesser, 2017).
Estas possibilidades de troca, favorecida através das novas tecnologias de comunicação, permitiram que a violência obstétrica fosse mais investigada no Brasil, e pelo mundo, através da pressão direta do movimento de mulheres e profissionais a favor dos direitos reprodutivos das mulheres (Sena & Tesser, 2017). É necessário, todavia, um pequeno aparte e referir que, em vários lugares do mundo em que se acionaram campanhas online de sensibilização da violência obstétrica através de testemunhos de vítimas, estes foram muitas vezes amplificados através dos medias tradicionais (televisão, jornais, etc.). No caso do Brasil, a media tradicional divulgou massivamente os resultados da investigação realizada pela Fundação Perseu Abramo, entre grupos de mulheres mãe, conectadas e organizadas nas redes sociais (Sena & Tesser, 2017, p.212), colocando ainda mais pressão para que o tema se tornasse parte da agenda nacional para a saúde.
A internet, per se, tem um grande papel de destaque nos restantes media – tanto pela sua complexidade em termos de alcance, como pela curiosidade que desperta – pelo que a ação viral das redes sociais digitais é exaltada pelos próprios medias tradicionais que replicam a própria informação (Sena & Tesser, 2017). No entanto, inicialmente, muita contrainformação e desconhecimento circulava sobre o assunto e tornava-se complicado para as mulheres reconhecerem práticas violentas, o que promovia desconfiança e descrença sobre a real existência deste problema. Esta é, todavia, uma lacuna que continua a existir em vários lugares, daí a importância constante das ações de sensibilização feitas pelos movimentos sociais através das redes e a partilha de testemunhos.
Para contrapor esta situação, e para estimular as mulheres a participarem na avaliação da qualidade dos serviços de saúde prestados durante o parto, um conjunto de ativistas promoveram, em 2012, um levantamento informal com o nome de “Teste da Violência Obstétrica” (Sena & Tesser, 2017, p.214). Este teste foi feito somente através da internet, em apenas três dias tinha já mil respostas, tendo avaliado 1996 nascidos, o que é considerado um resultado excelente. No mesmo ano, uma segunda intervenção foi feita utilizando as redes sociais digitais, com o objetivo de quebrar com a invisibilidade da violência obstétrica. As mulheres vítimas de violência obstétrica gravaram um pequeno vídeo de cerca de cinco minutos relatando a sua experiência (Sena & Tesser, 2017, p.214).
As redes sociais digitais têm reforçado a comunicação e a voz dos cidadãos, especialmente dos grupos historicamente oprimidos como é o caso das mulheres e que agora têm ganho mais representatividade. As redes sociais digitais trazem ao de cima histórias que antes não eram contadas, revelam o quão vulneráveis podem ser os indivíduos em determinados momentos, e como a sua fragilidade e carência as torna vítimas de violência. Os movimentos sociais digitais conquistam no espaço online recursos visuais e relatos em tempo real que não são possíveis de outra forma, provocando constantes revoluções na forma como produzem a informação e a disseminam (Muggah & Diniz, 2014).
A forma de denunciar situações de violência alterou-se, as vítimas e grupos de apoio adotaram estratégias cada vez mais proativas (Muggah & Diniz, 2014, p.23). As mulheres que denunciam, quem partilha, não são apenas utilizadores das redes, são cidadãos engajados com o objetivo claro de denunciar situações que consideram como injustas. O envolvimento destas mulheres mostra que a internet é um meio de comunicação válido para evidenciar violências que não têm sido problematizadas e contribuir para mudanças políticas importantes e urgentes, sobretudo quando se trata de cuidados de saúde (Sena & Tesser, 2017).
Assim, fortalecer estas redes fortalece a participação política das mulheres, expande a troca de experiências entre mulheres, utilizando a informação e consciência do seu corpo e saúde de umas para auxiliar outras e exigir mudanças no sistema. Como explicado por Cheryl Beck (2004), no seu estudo sobre partos traumáticos, existem diversos benefícios para as mulheres que participação de ações através das redes sociais digitais: o reconhecimento da sua experiência traumática, diminuição do sentimento de solidão, empoderamento – ao sentir que alguém “lhes deu voz” e, principalmente, sentir que contribui para que outras mulheres não passem pela mesma experiência traumática e isso, não tem preço.
Conclusão
Os movimentos sociais, ao trabalharem com e através das redes sociais, têm conseguido amplificar as suas reivindicações. No caso do movimento feminista contra a violência obstétrica, as redes sociais digitais têm conseguido quebrar com os processos de invisibilização destas experiências, apesar das vivências de milhões de mulheres por todo o mundo (Bocchi, 2018). A utilização de hashtag nas redes permitiu que os utilizadores das redes sociais fossem interpelados, acionando um processo de militância virtual (Bocchi, 2018).
Ao serem confrontadas com o negacionismo da existência da violência obstétrica, ainda que já tenham passado quase 40 anos desde que o movimento feminista começou a falar do assunto, estas mulheres conseguem através das redes sociais digitais o direito à memória e ao reconhecimento social do seu trauma (Orlandi, 2007 apud Bocchi, 2018, p.19). No espaço digital, as vítimas ganham um espaço de enunciação, que constitui assim um arquivo visível da sua dor que se torna complicado de contestar (Bocchi, 2018).
Assim, além de um exercício de sociologia das ausências e das emergências (Santos, 2002), visibilizar a violência obstétrica através das redes sociais digitais constitui também um exercício de tradução. Uma tradução que, ainda que parcial – pois a violência no parto é uma experiência que só poderá ser vivida por mulheres – é uma tradução feita através das imagens e dos testemunhos. Uma tradução do indizível, de uma experiência que pode ser traumática e que é, tantas vezes, retratada com ‘mágica’ (Bocchi, 2018). O testemunho nas redes sociais permite romper com o esquecimento político, com o silenciamento histórico e funciona como uma forma de reparação pública sobre as injustiças sofridas.
No que diz respeito às redes sociais digitais, estas têm constituído, desde o seu surgimento um terreno consistente de atuação dos grupos além da linha abissal (Santos, 2007). O espaço digital tem sido o lugar de mobilização, como se pode observar em vários momentos das últimas duas décadas, como o movimento Occupy Wall Street, ou o 15M e ainda a Primavera Árabe (Fernández, 2017), entre muitos outros. No caso dos exemplos citados, foram ações políticas de resposta ao modelo neoliberal que, de uma forma ou outra, nasceram nas redes sociais transpondo-se para o espaço público numa fase posterior.
Algo semelhante acontece com as lutas contra a violência obstétrica, no sentido em que, se considerarmos o espaço digital o novo espaço público, através das redes sociais estas discussões deixam o espaço privado a que estavam confinadas e passam para a vista de todos. As redes sociais servem de espaço de mobilização de ativistas pelos direitos reprodutivos e sexuais de mulheres por todo o mundo (Luz, 2014, p.128). O caso desta luta é particularmente especial por se tratar de um movimento que nasce no Sul Global, criado por mulheres da América Latina e que, depois, foi conquistando outros espaços geográficos. Demonstrando, mais uma vez, que o conhecimento nascido das lutas e do Sul epistémico é tão ou mais rico do que aquele apoiado pelo Norte epistémico (Santos, 2018).
Procurei demonstrar através deste artigo, de que forma as redes sociais digitais e todas as ferramentas das ditas ‘novas tecnologias de informação’ capacitaram os movimentos sociais em prol dos direitos sexuais e reprodutivos para chamar à atenção para o problema da violência obstétrica. Pode-se concluir que, existe – ainda – nas redes sociais digitais um potencial emancipador para os movimentos sociais e para grupos que são vítimas de opressão. No caso dos cuidados de saúde, o acesso à informação e a partilha de experiência é essencial para que os indivíduos possam pressionar o sistema. Sem ela, por se tratar de um assunto tão delicado, é fácil recair na aceitação acrítica de que todos os cuidados biomédicos são necessários e sem alternativas que respeitem a vontade dos indivíduos.
Isto torna-se particularmente importante quando se trata do momento do parto, que é um momento único e que marca não só profundamente a vida da mulher, como o próprio desenvolvimento da criança e os laços criados com a sua mãe. Os medias digitais servem, neste contexto de luta, para projetar experiências e, ainda que estejam sujeitos a análise e a discussão, ao fim de tantos testemunhos, tantas vozes insurgentes, é impossível para qualquer ser humano sensível ficar indiferente à experiência destas mulheres. Se isso servir para mudar vidas e formas de pensar, então será, mais um passo para uma (re)humanização do parto e para que justiça seja feita para com as vítimas de violência obstétrica.
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[1] Mestre em Antropologia Médica, Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra, laurabrito@ces.uc.pt
[2] Este artigo foi desenvolvido no enquadramento da Bolsa de Investigação, SFRH/BD/144322/2019, financiada pela FCT, I.P.
[3] “A ReHuNa […] é uma organização da sociedade civil que vem atuando desde 1993 em forma de rede de associadas(os) em todo o Brasil. […] Essa rede tem um papel fundamental na estruturação de um movimento que hoje é denominado “humanização do parto/nascimento”, do site oficial: http://rehuna.org.br/ (acessado a 5 de fevereiro 2020)
[4] La […] Relacahupan es un conjunto de redes nacionales, agrupaciones y personas que propone mejorar la vivencia del parto y la forma de nacer […].”, do site oficial: http://www.soniacavia.com.ar/relacahupan.com.ar/lared.html (acessado a 5 de fevereiro 2020)
[5] Lei nº38.668 de 23 de abril de 2007. Gaceta Oficial de la República Bolivariana de Venezuela. Caracas: La Asamblea Nacional de la República Bolivariana de Venezuela.